Kiyoshi Harada

 

Como se sabe o sujeito passivo da obrigação tributária reveste a figura de contribuinte quando este tenha relação direta com a situação que configura o fator gerador da obrigação tributária e reveste a figura de responsável tributário na hipótese em que ele não se encontra diretamente vinculado à situação configuradora do fato gerador, mas respondendo pelo crédito tributário por expressa disposição legal.

E aqui é oportuno esclarecer que a lei não pode atribuir a responsabilidade pelo pagamento do crédito tributário à terceira pessoa absolutamente estranha ao fato gerador da obrigação tributária.

Um exemplo servirá para aclarar essa questão.

O contribuinte do ICMS é a pessoa que venda a mercadoria, mas a lei pode atribuir a responsabilidade pelo pagamento do imposto ao comprador por razões de ordem pratica.

Dispõe o art. 7º da Lei nº 10.705/2000 que rege o ITCMD no Estado de São Paulo:

 

Artigo 7º - São contribuintes do imposto:
[...]
III - na doação: o donatário;
IV- na cessão de herança ou de bem ou direito a título não oneroso: o cessionário.

Parágrafo único - No caso do inciso III, se o donatário não residir nem for domiciliado no Estado, o contribuinte será o doador.

 

O inciso III cuida do donatário como contribuinte do imposto.

Doação é o contrato pelo qual alguém (doador) destina a outra pessoa (donatária) bens ou direitos a título gracioso por livre e espontânea vontade. O que é essencial na doação é a firme disposição do doador de transferir o bem ou direitos ao donatário, sem quaisquer ônus para ele.

Segundo o art. 42 do CTN o contribuinte é qualquer das partes na operação tributada, como dispuser a lei.

O Estado de São Paulo elegeu como contribuinte o donatário, salvo na hipótese em que o donatário não residir nem for domiciliado no Estado, hipótese em que será contribuinte o doador (parágrafo único do art. 7º).

No caso de bem situado neste Estado é irrelevante que o doador resida ou tenha domicílio neste Estado, bastando tão só que o bem doado se localize neste Estado.

Por exemplo, se o doador domiciliado no Estado do Rio de Janeiro fizer uma doação de bem localizado no Estado de São Paulo a favor de uma pessoa domiciliada no Estado do Paraná (donatária), o imposto deverá ser pago neste Estado pelo doador.

O inciso IV cuida da hipótese de cessão de herança ou de bem ou direito a título não oneroso, quando o contribuinte será o cessionário.

Na cessão não há transmissão causa mortis, uma das hipóteses de incidência do ITCMD. A cessão é sempre um ato entre vivos. Posto que a outra e derradeira hipótese de tributação pelo ITCMD é a doação, cumpre verificar se essa cessão configura ou não uma doação.

Dispõe o art. 538 do Código Civil:

 

Art538. Considera-se doação o contrato em que uma pessoa, por liberalidade, obriga-se a transferir do seu patrimônio bem ou vantagens para o de outra.”

 

Ora se a cessão da herança, bens ou direitos é realizada de forma não onerosa, por mera liberalidade do dono do patrimônio, explicitando o seu desejo de transferir o esse patrimônio ao cessionário penso que essa cessão se subsume ao conceito de doação previsto no citado art. 538 do CC.

Assim, o cedente é o doador e o cessionário é o donatário. Disso resulta que aparentemente o contribuinte já está definido no inciso III antes examinado. Mas, há uma particularidade na hipótese de cessão: não se aplica a regra do parágrafo único, do art. 7º voltada exclusivamente para a hipótese do inciso III, quando se tem como contribuinte o donatário.

Exemplifiquemos para melhor ilustrar o pensamento. Vamos supor um contrato de cessão gratuita de direito reais sobre um imóvel localizado em nosso Estado celebrado pelo cedente, domiciliado no Estado da Bahia a favor do cessionário, domiciliado no Estado do Pará. O imposto sem dúvida será devido ao erário paulista, porque aqui se localizam os direitos reais sobre o imóvel.

Mas, quem será o contribuinte: o cedente ou o cessionário? Posto que a regra do parágrafo único só se aplica em relação à hipótese do incido III, o contribuinte do ITCMD, no caso, será o cessionário, porque assim está expresso na Lei, independentemente, de o cessionário ter ou não domicílio neste Estado.

Por derradeiro na hipótese de inadimplemento da obrigação tributária pelo contribuinte respondem pelo pagamento do crédito tributário as pessoas nominadas no art. 8º que assim prescreve:

Art. 8º - Nos casos de impossibilidade de exigência do cumprimento das obrigações principal pelo contribuinte, respondem solidariamente com este nos atos em que intervierem ou pelas omissões de que forem responsáveis:

I - o tabelião, escrivão e demais serventuários de oficio, em relação aos atos tributáveis praticados por eles ou perante eles, em razão de seu ofício;

II - a empresa, instituição financeira e bancária e todo aquele a quem couber a responsabilidade do registro ou a prática de ato que implique na transferência missão de bem móvel ou imóvel e respectivo direito ou ação;

III - o doador, o cedente de bem ou direito, e, no caso do parágrafo único do artigo anterior, o donatário;
IV - qualquer pessoa física ou jurídica que detiver ver o bem transmitido ou estiver na sua posse, na forma desta lei;

V- os pais, pelos tributos devidos pelos seus filhos menores;
VI - os tutores e curadores, pelos tributos devidos pelos seus tutelados ou curatelados;
VII - os administradores de bens de terceiros, pelos tributos devidos por estes;
VIII - o inventariante, pelos tributos devidos pelo espólio.”

 

Cumpre observar a impropriedade da redação contido no caput do art. 8º. A exigência do imposto será sempre possível. O que pode existir é o não pagamento do imposto exigido.

Nesse sentido deve ser interpretado o art. 8º sob exame. Não cabe ao fisco exigir o imposto do responsável sem que antes tenha exigido do contribuinte.

E mais, apesar de a norma referir-se à responsabilidade solidária, na verdade, o responsável tributário somente responde pelo pagamento do ITCMD nos atos em que interveio ou pela omissão de que for responsável.

 

SP, 19-9-2022.