(por uma tentativa de um resgate histórico
sério, rigoroso, objectivo)
Cumpriu-se a 21 de Maio de 2022, sábado pretérito, o 34.º aniversário da AIDC/IACL –Associação Internacional de Direito do Consumo.
NETCONSUMO propôs-se ouvir, na circunstância, Mário Frota, fundador e primeiro presidente da instituição, que viu a luz do dia em Coimbra no recuado ano de 1988, no temo do I Congresso Mundial das Condições Gerais dos Contratos / Cláusulas Abusivas e cuja sede se situou, provisoriamente, na Faculdade de Direito da Universidade de Coimbra.
NETCONSUMO: a que se deveu a luminosa ideia de constituir uma sociedade científica internacional, congregando, no seu seio, os juristas que então se consagravam já ao estudo da novel disciplina do Direito do Consumo?
Mário Frota: A algo de muito simples, na aparente complexidade dos seus termos: o I Congresso Mundial das Condições Gerais dos Contratos / Cláusulas Abusivas, que houve lugar em Coimbra, por iniciativa nossa, de 18 a 21 de Maio de 1988, sob a égide da Comunidade Económica Europeia e do egrégio presidente da sua Comissão, o eminente Jacques Delors, reuniu um enorme leque de nascentes jusconsumeristas. O Congresso que, naqueles recuados tempos, em que as comunicações eram bem mais difíceis que as que se processam hoje em dia, reuniu representantes de 32 Estados-nação de todos os Continentes, e registou a presença de mais de 700 participantes, trouxe a Coimbra a nata do novel ramo de direito. Acresce que a realização do evento não foi isento de escolhos: a Faculdade de Direito da Universidade de Coimbra,a casa de origem do ora entrevistado, que pelo seu Conselho de Direcção, a que presidira Figueiredo Dias, tendo como seu número dois, Manuel Porto, dera à iniciativa o seu suporte institucional, o seu aval científico e a promessa de apoio administrativo, deliberação, aliás, ulteriormente ratificada, veio ulteriormente, já sob nova gestão, a denunciar os compromissos assumidos. A Reitoria da Universidade, capitaneada por um professor de Direito, Rui de Alarcão, propusera-se patrocinar a iniciativa pelo seu “elevado alcance” e acabou, afinal, por lavar de tudo as “mãos como Pilatos”... Um professor da Casa, porém, que se deslocara em 1987 à Grécia, em “missão” do Conselho Português para a Paz e Cooperação, inspirado e mantido pelo Kremlin, de seu nome, Orlando de Carvalho, ouvira da boca da Relatora grega, de há muito convidada, Elisa Alexandridou, que se deslocaria a Coimbra a fim de intervir no Congresso que originariamente teria um âmbito Europeu. E, ao ser surpreendido, por nada haver sabido (e nem teria de estar informado a tal propósito por não pertencer, ao tempo, a qualquer órgão relevante da Faculdade…), logo ali “jurou” que tal Congresso, sob a égide da Faculdade de Direito, jamais se concretizaria, que em circunstância alguma se levaria a cargo porque os órgãos da Casa o inibiriam. E que a Colega da Faculdade de Direito de Salónica, a Elisa Alexandridou, não contasse efectivamente com o evento e a sua deslocação à Lusa-Atenas. O facto é que, de regresso a Portugal, aquele docente, movido não se sabe por que intuitos, na primeira reunião do Conselho Científico em que tinha assento, bem ao seu jeito, inflamou os ânimos contra o Congresso e o seu promotor, o ora entrevistado, mero assistente da Casa, e logo ali obteve a aquiescência do Conselho a que não daria o seu aval à iniciativa, após haver tempos antes o tal Conselho garantido o patrocínio científico ao Congresso “dada a importância do tema e seu debate”…
Sucede que a Comissão Executiva do Congresso fora constituída, em razão das afinidades com o tema, pelo ora entrevistado, que tivera a ideia e por ela se batera, o Prof. Manuel Porto, director do recém-criado Curso de Estudos Europeus, ante a iminência, ao tempo, do ingresso de Portugal na então Comunidade Económica Europeia, pelo procurador geral-adjunto da República, Neves Ribeiro, mais tarde Conselheiro (Ministro) do Supremo Tribunal de Justiça, director do Gabinete de Direito Europeu do Ministério da Justiça, que acompanhava o processo legislativo europeu em Bruxelas e em Estrasburgo, sede do Parlamento Europeu, e um tal Manuel Estevão, presidente do então Instituto Nacional de Defesa do Consumidor que relevava da Administração Pública.
Não se tratava de uma iniciativa sem suporte, uma mera aventura de um qualquer espírito perturbado que se propusera “dar nas vistas” ao realizar algo de peso no seio da Faculdade de Direito de uma Universidade vetusta e prestigiada.
Mas a iniciativa contava ainda com o apoio institucional do Reitor Honorário da Universidade de Coimbra, o Prof. Ferrer Correia, aliás, professor jubilado da Faculdade de Direito e renomado internacionalista, ao tempo já presidente da prestigiosíssima Fundação Calouste Gulbenkian, que se estabelecera em Lisboa.
Perante os rumores e o alarido de que o Congresso abortara às mãos dos “obstetras” da Faculdade de Direito, o ora entrevistado procurou o então presidente do Conselho Científico, o Prof. Rogério Eherardt Soares, que o sossegou afirmando peremptoriamente que “não seria avisado antecipar angústias” e que tudo a seu tempo se concretizaria sem obstáculos, dada a relevância da iniciativa, aliás, de louvar.
Renegando compromissos e em situação de patente deslealdade, quer o Conselho Directivo, que entretanto mudara de mãos, quer o Conselho Científico houveram (por mal) recusar o seu patrocínio à iniciativa, vergados à autocrática “decisão” de Orlando de Carvalho, nos seus tergiversantes modos de procedimento.
Perante as circunstâncias, o ora entrevistado entendeu prevenir os seus pares da Comissão Executiva das dificuldades entretanto criadas por Carvalho e seus sequazes momentâneos, mas o propósito fora unânime: a prossecução dos trabalhos, aliás, em adiantado estado de desenvolvimento (estávamos em Setembro de 1987 e o Congresso estava aprazado para Maio de 1988, com a Comissão Europeia envolvida na sua concretização, subvenções asseguradas, elenco de relatores nacionais garantido, trabalhos encetados e o mais que manifestações do jaez destas pressupõe e reclama com uma confortável antecedência.
Pede o ora entrevistado, entretanto, uma audiência ao Reitor da Universidade, que anuiu em conceder-lha, não sem um hiato, naturalmente para se inteirar das movimentações no seio dos órgãos recheados de cabeças laureadas da Faculdade.
E, no decurso da audiência, o Reitor, peremptório, retirou (não reiterou, retirou literal e ostensivamente) o patrocínio científico da Universidade, fez pandã com a “sua” Faculdade [como entendeu realçar, por solidariedade acrítica (e infundada)com os seus pares]fez sustar os apoios logísticos de qualquer ordem, como as hospedagens e os repastos no Palácio de São Marcos (um lugar de distinção de que a Universidade desfruta nos arrabaldes de Coimbra) e o mais que seriam facilidades próprias das estruturas da própria Universidade. Perante a recusa da Comissão Executiva em retirar-se e em malbaratar o laborioso esforço até então despendido, mantendo-se o Congresso, o então Reitor – por entre ameaças de teor diverso, algo que importa revelar em homenagem à verdade e à história dos acontecimentos então vividos – prometeu tudo fazer para que a iniciativa abortasse. Sem o conseguir, porém, dada a intransigência da Comissão executiva constituída e que operava em termos de efectiva coordenação entre os seus membros decididos a cumprir os compromissos ajustados com os relatores e suas instituições e com o público em geral que se inscrevera maciçamente para participar do evento.
O ora entrevistado, na esteira de outras iniciativas levadas a cabo desde os inícios dos anos 80 com os estudantes das Faculdades de Direito e de Farmácia, onde ao tempo leccionava, reuniu meia centena de estudantes dos diferentes anos da Faculdade de Direito para constituir um Secretariado que se ocupasse de todas as tarefas, das administrativas às logísticas, e empreendeu então o caminho em ordem à sua laboriosa organização do Congresso. Um entusiástico grupo de estudantes que se não poupou a esforços para levar por diante as tarefas constantes da carta de missão consignada a cada um dos departamentos por que se estruturou – dos contactos internacionais, às reservas de passagens e hospedagens, já que Coimbra não dispunha, ao tempo, de um parque hoteleiro para acolher uma mole tão significativa de participantes (um só hotel com dignidade e um número restrito de acomodações pelo que haveria que recorrer ao Luso, à Curia, distantes mais, bem mais de uma trintena de quilómetros de Coimbra (e com acessos mal amanhados) e a locais distantes com o que tal pressuporia de acrescidas dificuldades de transportes. Ante as tomadas de decisão da Escola e da Reitoria, os estudantes reforçaram os seus ímpetos e ter-se-á desenhado o espectro de uma greve académica que só se sofreou mercê da nossa intervenção, já que o que se fizesse – e houve plena compreensão do fenómeno - seria sempre em desfavor do congresso e do prestígio das instituições e personalidades neles envolvidas.
E o Congresso fez-se com um enorme sucesso.
A AAC – Associação Académica de Coimbra, a mais antiga e prestigiosa associação de estudantes da Europa, pela sua presidente, oriunda do Direito, Ana Paula Barros, e com o suporte de uma das suas colaboradores, prestimoso elemento do Secretariado, Ester Guedes, assegurou a ligação da Academia ao evento. E os estudantes, seus filiados, tiveram nele um papel preponderante. Que ninguém terá decerto, pela originalidade patente, olvidado, tantos anos volvidos.
E como se se tratasse de uma organização profissional de eventos científicos, numa altura em que de tal mal se excogitava, entre nós, os estudantes que integraram o Secretariado, uma meia centena de dinâmicos e operosos elementos, houveram-se com uma enorme galhardia, um brio insuperável, uma extraordinária abnegação, empenhando-se com uma singular dedicação e precisão, algo de que de todo beneficiou, em termos de imagem, tanto a Universidade como a Escola de Direito que não só se puseram à margem, como hostilizaram de forma ignóbil tão marcante evento. Mais: a ousadia da realização, contra as directrizes do Reitor,teve notórios reflexos na carreira do elo mais fraco, o assistente que ousara afrontar as teias de aranha de uma instituição bafienta que mal enxergava para além da sua sombra escassamente esbatida em manhã de denso nevoeiro. Mas pouca relevância atribuiu o visado a métodos tão ao sabor das autocracias persecutórias…
E o Congresso fez-se, sem e a despeito do que a Universidade e a Faculdade entenderam ser o caminho, barrando as vias à Organização, erguendo obstáculos e contrariando propósitos.
Em termos institucionais, sempre nos propusémos silenciar o escândalo. Não fora a imagem exterior degradar-se e comprometer a realização do inadiável evento. O Congresso fez-se e nem uma palavra só, um queixume, uma recriminação, uma denúncia com pública ressonância. Nem sequer se beliscou as instituições que afrontaram a iniciativa e que, no dizer de Ferrer Correia, o Reitor Honorário (e há quem o testemunhe porque ainda no rol dos vivos, dos supérstites), no seu desassisamento, perderam a invulgar oportunidade de colocar o nome da Faculdade e o da Universidade em iniciativa de tão vasto alcance e repercussão internacional. Que ecoou pelos países dos que estiveram e puderam auscultar a essência da Alma MaterConimbrigensis…
E só agora se dá efectivamente a saber, em rigor, depois de uma ligeira referência aqui e além, do que se viveu nos bastidores naqueles tempos amaros. E com riscos de toda a ordem. E com os partidos políticos, com menor peso na Faculdade de Direito, a alimentar enormes torrentes de boatos e a pretender prejudicar a consecução do evento, em jeito de “fakenews” com os contornos dos tempos (sabendo-se como se não ignorava que… “os boatos ferem como uma lâmina”).
Muitos dos colegas que se postaram ao lado dos órgãos da Faculdade ou da Reitoria contra a organização do Congresso não deixaram de “ir espreitar” os trabalhos e de se render à evidência do se se fizera.
Nunca ninguém afrontara órgãos tão poderosos e nomes de si tão sonantes, muitos dos quais subservientes ao antigo regime, mas instalados em pleno, em lugares de destaque na Escola, nos idos de oitenta, após o retorno às cátedras findos os saneamentos havidos, como um docente ignorado, vindo das Áfricas em abandono, antes ainda da tão decantada ”exemplar descolonização” (que fora a obra mais ominosa do regime nascente, como na circunstância de distintos quadrantes vultos da sociedade portuguesa proclamaram), mas que mantivera os seus propósitos contra as ameaças e recriminações de que fora alvo, como destacado elemento da Comissão Executiva do evento. Com traições em alta porque pressupostamente a corda parte sempre pela parte mais fraca... Mas a Comissão Executiva do Congresso não tergiversou, mostrou-se coesa e enfrentou com denodo os órgãos da Escola e a ferida Reitoria.
A atitude de indefectível coragem de um Manuel Porto, ao tempo professor auxiliar da Faculdade de Direito (…), de um Neves Ribeiro, alto dirigente do Estado, magistrado impoluto, de antes quebrar que torcer e, ao tempo, em posição ainda solidária do M. Estêvão, da Defesa do Consumidor (instituto dotado de autonomia administrativa) foram determinantes para que o Congresso se fizesse e o sucesso fosse retumbante, sem quaisquer excessos nem patente exagero na apreciação.
O presidente do INDC (Defesa do Consumidor), adstrito à Administração Pública,revelar-se-ia mais tarde inconsequente no suporte à própria AIDC/IADCL, cuja sede internacional deixaria escapar para Bruxelas para servir as ambições de um tal Bourgoignie, que se tornara presidente da organização, numa atitude de manifesta ausência de cooperação e de solidariedade.
A história terá de registar estes factos sem o que tudo ficará por explicar. E sem se perceberem eventuais conexões ente uns e outros dos que subjacentemente enformam a realidade então experimentada.
NETCONSUMO: Mas… e onde entra aqui a AIDC – a Associação Internacional de Direito do Consumo?
Mário Frota:Em meio a todo este arrazoado, que, é, afinal, causa a um tempo remota e próximada constituição, da fundação da AIDC/IACL, em Coimbra, por ideia e iniciativa nossa, cumpre dizer que – perante um tal quadro de sujeições, perseguições e ataques – iniciativas do jaez do Congresso soçobrariam se se estivesse à espera da Faculdade de Direito ou da Universidade de Coimbra, atidos a tão falhas perspectivas e a uma miopia tão acentuada e, o que é mais, com a menor simpatia por actos de rebeldia como os que se traduziram na realização do Congresso Mundial, à revelia dos comandos das instituições tutelares. Daí que houvéssemos entendido que em ordem à prossecução de jornadas do estilo, da concretização de manifestações científicas como seminários, simpósios, colóquios, conferências, congressos, houvesse que lograr suporte em qualquer outra plataforma.
Já havia, ao tempo, a IOCU – InternationalOrganisation for ConsumerUnion’s (mais tarde ConsumersInternatinal - CI), que congregava as associações autênticas e genuínas de consumidores instaladas um pouco por toda a parte.
Haveria que criar uma sociedade científica internacional que se disseminasse pelo globo e promovesse o estudo e a investigação do direito do consumo, constituindo o elo de união de quantos, nas sete partidas do globo, se consagrassem a um tal mester.
Havia em Montpellier, fruto do génio de Jean Calais-Auloy, o CDC – Centre de Droit de la Consommation, adstrito à Faculdade de Direito, na Universidade Católica de Lovaina, em Louvain-la-Neuve, um centro homónimo, o Center for ConsumerLaw Research, da BrunelUniversity, West London, o ZentrumfürEuropaïscheundRechtspolitik, da Uniersidade de Bremen, na Alemanha, com Norbert Reich, e, em lugar de se propor à Faculdade de Direito da Universidade de Coimbra, algo de análogo, ante as animadversões criadas e em explosão, entendeu-se trazer a lume a AIDC- Associação Internacional de Direito do Consumo / AssociationInternationale de Droit de la Consommation / InternationalAssociation for ConsumerLaw, para que interessáramos Jean Calais-Auloy, de França, EwoudHondius, Hans Micklitz (Norbert Reich não pôde comparecer, mas figura no núcleo de fundadores), da Alemanha, de EwoudHondius, dos Países Baixos, de Bourgoignie, da Bélgica, de António Herman de Vasconcellos e Benjamin, do Brasil, de PalleBoMadsen, da Dinamarca, T. Neil, da Austrália, e outros para a celebração da escritura de constituição, exactamente no termo do Congresso Mundial das Condições Gerais dos Contratos / Cláusulas Abusivas (originalmente, I Congresso Europeu das Condições Gerais dos Contratos). Cuja sede, curiosamente, se estabeleceu na Faculdade de Direito da Universidade de Coimbra (já que as escolas não são propriedade dos que preponderam num dado momento, como se tem por curial), como consta, aliás, do documento original, no Gabinete de trabalho que, como docente, o ora entrevistado, detinha numa das alas dos Gerais, designação corrente do edifício em que definitivamente se instalaram, em 1573, a mando de D. João III, os Estudos Gerais, criados no 1.º de Março de 1290, transitoriamente estabelecidos de antanho em Lisboa.
NETCONSUMO: E como foram os primeiros passos da novel instituição?
Mário Frota: E assim surgiu, formalmente, a AIDC – Associação Internacional de Direito do Consumo – que, desde logo se empenhou num sem-número de iniciativas de pendor científico, imbricadas no cerne do Direito do Consumo, como ramo nascente do Direito Privado.
A presidência da Comissão de Instalação da AIDC foi-nos cometida, após a constituição, pelos nossos pares.
Logo a de 26 a 29 de Abril de 1989, a AIDC – Associação Internacional de Direito do Consumo – promoveu, em Coimbra, sob a égide da Comunidade Económica Europeia e da Faculdade de Farmácia da Universidade de Coimbra, o I Colóquio Europeu de Direito do Medicamento com a participação de representantes dos 12 Estados-membros da então C.E.E., nos Auditórios dos Hospitais da Universidade de Coimbra.
De seguida, sob o impulso de António Herman Benjamin e com a aquiescência da comissão a que presidíramos, se realizou, no Brasil, uma sequência de eventos científicos em suporte à Comissão de Elaboração do Código de Defesa do Consumidor cuja coordenação coubera a Ada PellegriniGrinover e a José Geraldo Brito Filomeno e a que pertenciam, além do promotor da iniciativa, Benjamin, KazuoWatanabe, ZelmoDenari, Daniel Roberto Fink eNelson Nery Júnior.
Com efeito, o segundo evento foi o I Seminário Internacional, fora da Europa, e que houve lugar no Rio de Janeiro de 26 a 28 de Maio de 1989, no edifício-sede do BNDES, e que reuniu uma plêiade de juristas de real valia, a saber, EikeVonHippel, Norbert Reich, (Alemanha), EwoudHondius (Países Baixos), PetterMags (E.U.A), Sinai Deutsch (Israel), T. Niel (Austália), PalleBoMadsen (Dinamarca), KierstiGraver (Noruega), GunnelSöderblom(Suécia), Henri Temple (França), entre outros.
E de 29 de Maio a 02 de Junho de 1989, no Salão Nobre da Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo, o I Congresso Internacional de Direito do Consumidor, o segundo fora de portas, e que reuniu a nata da nascente jusconsumerística internacional, em nosso entender, conquanto o rótulo a muitos não grudasse dada a sua férrea formação civilística, considerando o direito do consumo como mera partícula, susceptível de revolucionar ou, melhor, modernizar o direito privado, na sua convencional teia meramente formalista
Os temas em debate abarcavam os da pós-moderna disciplina que no Brasil, de forma ainda incipiente, se denominava Direito do Consumidor, numa concepção ainda política do domínio de que se trata, para usar a expressão do juslaborista castelhano, Perez de Leñero, das condições gerais dos contratos à responsabilidade do produtor por produtos defeituosos (que no Brasil, em tradução literal do francês, se grafou como a ‘responsabilidade pelo fato do produto’).
E, para além do Seminário e Congresso, que foram marcantes e decisivos para a afirmação do anteprojecto do Código brasileiro de Defesa do Consumidor e seus ulteriores trâmites nas Câmaras, o I Encontro Nacional de Direito do Consumo, em Coimbra, de 21 a 23 de Novembro de 1989, com uma luzidia representação do Brasil, com António Herman Benjamin, Daniel Roberto Fink, Eloísa Cáceres, MarilennaLazzarini, entre outros entusiastas das matérias em debate.
NETCONSUMO: Mas os feitos não se ficaram por aí…
Mário Frota:Com efeito, dada a expressão que a AIDC assumira, entretanto, com o impulso registado no Brasil, pelo inegável contributo de Benjamin, a 31 de Maio de 1989, no OttonPalace, de São Paulo, em reunião restrita em que se achavam o presidente da AIDC, nós mesmos, Herman Benjamin, T. Niel, PetterMaggs, Sinai Deutsch e Bourgoignie, se constituiu uma “comissão ad hoc” para estudo e elaboração de propostas de reformulação dos estatutos da AIDC dada a dimensão verdadeiramente internacional que se projectava nas sete partidas do globo, formada, aliás, pelos presentes, que teve sequência, mais tarde, no Congresso de Montreal, em que não participou o presidente da instituição mercê de impedimentos da sua vida académica em Portugal.
NETCONSUMO:Mas, entretanto, os eventos prosseguiram com análogo fôlego, não?
Mário Frota:Com efeito… Em Maio de 1990 a AIDC e seu presidente apresentaram a proposta de criação do INSTITUTO UNIVERSITÁRIO EUROPEU DE DIREITO DO CONSUMO, que teve, ao tempo, um entusiástico acolhimento, mas não logrou concretização por desfastio das autoridades portuguesas.
E, por iniciativa do membro brasileiro na Comissão de Instalação e sob a égide da presidência da AIDC, se realizou, em São Paulo, de 28 de Maio a 01 de Junho de 1990, o II Seminário Internacional de Direito do Consumidor, na Faculdade de Direito do Largo de São Francisco.
Mas ainda com a participação da AIDC,no II Seminário Internacional de Direito Sanitário, promovido pelas Faculdades de Direito de da Saúde Pública da USP, sob a superior coordenação da Prof.ª SuelliGandolfiDallari e a presença dos Profs. François Chabas, de Paris XII, e de A. Béranger, de Bordéus. E a nossa intervenção sob o tema “A Responsabilidade Civil no Processo de Concepção, Desenvolvimento, Produção, Distribuição e Dispensa do Medicamento”.
E, subsequentemente, numa surpreendente maratona, um sem-número de eventos cujo fito era já o da divulgação das linhas mestras do Código cuja publicação se projectava já muito próxima (de notar que estávamosno primeiro semestre de 1990: e o Código, uma vez promulgado, viria a ser publicado pela Lei 8078, a 11 de Setembro de 1990, com o começo de vigência protraído para 11 de Março de 1991):
- Porto Alegre: 01 de Junho de 1990 (I Encontro Nacional de Promotores de Justiça Curadores do meio Ambiente e da Defesa do Consumidor, na Faculdade de Direito da Universidade Federal do Rio Grande do Sul)
- Universidade Federal do Ceará, em Fortaleza, datas intermédias
- Universidade Estadual da Paraíba, Campina Grande: 06 de Junho de 1990
- Universidade Federal da Paraíba, João Pessoa: 07 e 08 de Junho de 1990
De 18 a 21 de Setembro de 1990, já após a triunfal publicação do Código de Defesa do Consumidor, em obediência aos comandos da Constituição-Cidadã de 05 de Outubro de 1988, no Jornal Oficial de 11 de Setembro de 1990, a AIDC, pelo seu vigoroso braço no Brasil e o insubstituível suporte da sua direcção internacional, ainda sediada em Coimbra,a que presidíamos, organizou o II Congresso Internacional de Direito do Consumidor (em rigor, o III Congresso sob os auspícios da instituição) no Rio de Janeiro.
E aí compareceu, Jean Calais-Auloy, o Pai do Direito Europeu do Consumo e seu introdutor em França, a cujos estudos se ficou a dever o seu Code de la Consommation, que a lume veio em 1993, depois das Comissões a que presidiu, com realce para Commission de RefonteduCode de la Consommation [de 1992]. E expoente do Direito do Consumo Universal.
Antes, a 17 de Setembro de 1990, em S. Paulo, sob o influxo da AIDC e a organização da Federação do Comércio do Estado de São Paulo (FECOMÉRCIO), houve lugar o IFÓRUM DE DEBATES SOBRE O DIREITO DO CONSUMIDOR, que colheu uma enorme adesão dos patrões do comércio, relevante para a aceitação do Código e suas orientações, susceptível de se compaginar com as leis mais desenvolvidas do globo em termos de equilíbrio de posições entre comerciantes e consumidores.
De 24 a 27 de Setembro de 1990, em São Paulo, realizou-se o III Seminário Internacional (o I interno), sob os auspícios da AIDC, na Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo.
De 07 a 10 de Novembro de 1990, a AIDC – Associação Internacional de Direito do Consumo –promoveu, com efeito, o seu IV Congresso Internacional (de 1988 a esta 1990), titulado, porém, como I CONGRESSO INTERNACIONAL DA RESPONSABILIDADE DO PRODUTOR POR PRODUTOS DEFEITUOSOS com uma luzidia representação do Brasil, entre os quais Herman Benjamin, relator da nação irmã, ainda no Ministério Público de São Paulo, e António Carlos Navega, Procurador-geral de Justiça do Estado do Rio de Janeiro.
Trata-se de mais uma manifestação que contou com o elevado patrocínio da Comissão Económica Europeia, ainda sob a presidência de Jacques Delors, um dos presidentes de maior destaque, que sempre nos concedeu o benefício da sua tutela às manifestações por nós promovidas, algo que cumpre registar penhoradamente.
Já no ano imediato – em 1991 –a AIDC teve relevante papel na criação de duas instituições vocacionadas especificamente para a informação e a informação do consumidor, em Portugal: o Instituto Nacional de Educação do Consumidor e o Instituto Português de Informação do Consumidor, qu o então Instituto Nacional de Defesa do Consumidor, sob a presidência de um tal Manuel Estêvão,de má memória, combateu incessantemente a pretexto de quesó o Estado poderia ter institutos, que não a sociedade civil.
A AIDC patrocinou cientificamente, em Porto Alegre, o III (pela renumeração consequente e autêntica,o V(quinto) … o V)CONGRESSO INTERNACIONAL DE DIREITO DO CONSUMIDORque, sob a égide da Procuradoria-Geral de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul e da Associação Estadual do Ministério Público, se realizou na Capital do Rio Grande do Sul de 10 a 14 de Março de 1991.
A AIDC promoveu ainda a 16 de Março de 1991, em Lisboa, no Novotel, em parceria com o Instituto Francisco Sá Carneiro, sob a presidência de antigaministra LeonorBeleza, e a presença de Jean-Calais Auloy e T. Bourgoignie,um SEMINÁRIO INTERNACIONAL ‘PARA UM CÓDIGO DE DIREITO DO CONSUMO’.
A AIDC, sob o a competente condução de Benjamin e a esforçada intervenção dos seus membros dirigentes,desenvolveu, um pouco por toda a parte, uma sorte de Seminários de Direito do Consumidor ou manifestações de análogo jaez, a saber, designadamente:
- Universidade Federal da Paraíba, João Pessoa – 28 de Março de 1991, sob o tema “O Direito do Consumidor na Comunidade Europeia”, com uma intervenção nossa;
- Universidade Federal do Ceará, Fortaleza – 1 e 2 de Abril de 1991 – sob a consigna da “Educação do Consumidor na Europa”
- Faculdade de Santa Cecília dos Bandeirantes, Santos – 4 de Abril de 1991 - “ A Responsabilidade do Produtor por Produtos Defeituosos: o contraste entre a Directiva Europeia de 1985 e o CDC brasileiro de 1990”
- Federação do Comércio do Estado de São Paulo, São Paulo – 5 de Abril de 1991 – Seminário “Aprofundando o Código de Defesa do Consumidor: quem assume a responsabilidade na empresa?”
- Ministério Público Federal do Brasil, São Paulo – 5 de Abril de 1991 – Seminário “A promoção dos interesses e a protecção dos direitos dos consumidores na Europa: o Plano Trienal de Acção”
- Secretaria de Estado da Defesa do Consumidor (secretário de Estado, Paulo Salvador Frontini), São Paulo, “I Reunião dos Órgãos de Defesa do Consumidor do Estado de São Paulo”, com uma intervenção do presidente da AIDC.
E, em Macau, a 16 de Julho de 1991, sob a égide do Conselho de Consumidores da Região Especial, o I Seminário “Direito e Acesso do Consumidor de Justiça”com uma intervenção do presidente internacional da AIDC.
A AIDC patrocinou e promoveu em 1991, de 17 a 19 de Outubro, em Coimbra, sob os auspícios da, ao tempo, Comunidade Europeia, a I Conferência Europeia de Educação do Consumidorcom a participação de todos os Estados-membros.
NETCONSUMO: e decerto que não fica por aí…
Mário Frota: Com efeito,durante o período em que a presidência internacional da AIDC nos esteve cometida as actividades científicas, as manifestações de toda a ordem por nós projectadas, em parceria com o Brasil e a Argentina, tiveram uma expressão superlativa.
Com a remodelação dos estatutos, a trasladação da sede internacional para Bruxelas e a e a presidência rotativa que principiou com Bourgoignie, afastado, entretanto, do Centre de Droit de la Consommation, de Louvain-la-Neuve, a AIDC passou a ter só e tão só uma rotineira manifestação científica – um Congresso Internacional – de dois em dois anos.
Sob a nossa presidência até 1994, a AIDC ainda interveio, na realidade, em um sem-número de eventos científicos.
A AIDC deu o seu patrocínio científico ao I SEMINÁRIO INTERNACIONAL DE DIREITO DO CONSUMO, no Porto:no quadro das actividades de extensão universitária da Universidade que sucedeu à Universidade Livre, teve lugar de 23 a 25 de Janeiro de 1992, na Cidade Invicta, um concorrido seminário com a participação, entre outros, para além de especialistas nacionais, de eminentes jusconsumeristaseuropeus, como Jean Calais-Auloy, EwoudHondius, BerndStauder e Lopéz-Sanchez.
O III (na realidade, o VI, o sexto ) CONGRESSO INTERNACIONAL DE DIREITO DO CONSUMIDOR, que a AIDC promoveu, através das estruturas e de exímios colaboradores que Benjamin afectou para o efeito, Adalberto Pasqualotto (M.P.), Eládio Lecey (Judicatura), Cláudia Lima Marques (Universidade Federal - URGS…) que de 13 a 14 de Março de 1992 teve por cenário a aprazível Canela, no Rio Grande do Sul, trouxe um naipe de juristas de nomeada da vizinha Argentina, para além de europeus e não europeus que ofereceram aos congressistas temas recheados de sumo interesse.
As JORNADAS DE DIREITO DO CONSUMIDOR promovidas no Centro de Estudos Judiciários, em Lisboa, a 27 de Março de 1992, contaram também com o patrocínio da AIDC àquela casa de formação de magistrados judiciais e do Ministério Público.
Em 1993, o IV (em rigor, pela recontagem, o VII, o sétimo) CONGRESO INTERNACIONAL DE DERECHO DEL CONSUMIDORque se levou a cabo de 25 a 29 de Maio de 1993, em Buenos Aires, e a que presidimos, sob organização de Gabriel Stiglitz, foi-o sob os auspícios da AIDC.Outrotanto no que tange ao II CONGRESO IBERO-LATINO-AMERICANO DE DERECHO DEL CONSUMIDOR, que se realizou em Buenos Aires a 28 e 29 de Maio de 1993 contou de igual modo com o beneplácito da AIDC.
Em 1994, em Brasília, houve lugar o II CONGRESSO BRASILEIRODE DIREITO DO CONSUMIDOR, obviamente sob os auspícios da AIDC e já coma organização do BRASILCON– Instituto Brasileiro de Política e Direito do Consumidor - que se havia constituído em 1992 em modelo vazado, aliás, na apDC, como antena nacional da AIDC, ainda que hoje de forma esbatida ou sem quaisquer conexões palpáveis, visíveis, efectivas.
Já em 1995, ainda sob as lentes da AIDC, mas com a organização do BRASILCON e sua estrutura institucional, em Blumenau, Santa Catarina, de 29 a 31 de Outubro de 1995, se promoveu o I CONGRESSO INTERNACIONAL DA RESPONSABILIDADE CIVIL (o IX da série da Associação Internacional, se o entendermos como tal).
NETCONSUMO:
Perante um tal quadro, os leitores decerto que perderão o fôlego, dada a forma exaustiva como o nosso entrevistado traçou os anos de vida [sete anos, no dizer emblemático do Poeta: Sete anos de pastor Jacob servia |Labão, pai de Raquel |serrana Bela | Mas não servia ao pai servia a ela | Que a ela só por prémio pretendia]…
Sete anos plenos de actividade, nem sempre fáceis pelos obstáculos antepostos, pelas incompreensões, por disputas inconsequentes mesmo entre pares, mas sete amplos de uma magnitude sem par.
NETCONSUMO agradece a disponibilidade do entrevistado, o fundador da AIDC, que nesse projecto congregou outros e tão lúcidos espíritos, designadamente como Herman Benjamim, hoje ministro do Superior Tribunal de Justiça de Brasília.
Parabéns, Prof. Mário Frota, por tamanhos feitos, por tanta actividade em prol de todos, algo decerto ignorado pelas gerações que entretanto se foram sucedendo na árdua labuta de dar continuidade às instituições.
Muitos e muitos parabéns!
Mário Frota
A nós é que nos cumpre agradecer a paciência com que o repórter assistiu ao desfiar deste rosário de recordações, ciosamente guardado ao longo dos tempos, sendo até natural que algo nos haja escapado neste emaranhado de actividades, exercido em paralelo com o desempenho da função docente que fomos exercendo em Portugal e em Paris e, desde 1989, cumulativamente com a presidência da apDC, instituição homóloga do Brasilcon.