I Artigo
Contingenciamento de recursos financeiros
Kiyoshi Harada
O contingenciamento de recursos financeiros é um dos instrumentos que desorganiza a programação orçamentária, isto é, torpedeia o orçamento público.
Já está arraigado na cultura de nossos governantes o contingenciamento. Anteriormente ele ocorria no início do exercício. Hoje ocorre no começo, no meio e no final da execução orçamentária.
Os governantes elegeram, equivocadamente, que contingenciar recursos era sinônimo de austeridade no manuseio do dinheiro público. Nada mais equivocado!
As despesas públicas foram fixadas na Lei Orçamentária Anual – LOA – para satisfação das necessidades públicas que não comportam suspensões temporárias.
Afinal, governar é sinônimo de aplicar os recursos na consecução da finalidade estatal. O governo que contingencia recursos de forma sistemática deixa de governar.
Aludidos contingenciamentos, atualmente, atingem setores da saúde e educação contemplados pela Constituição com verbas mínimas, comprometendo as ações de saúde e da educação. São inconstitucionais.
As causas desse contingenciamento são das mais variadas, mas a principal causa repousa na ausência de organização administrativa.
Há uma sobreposição de órgãos públicos que mais atrapalham do que resolvem, sem planejamento das atividades com os fantásticos recursos concentrados, conduzindo ao desvio de verbas públicas.
Só para citar, temos a Central de Medicamentos, de um lado, e a Fundação Nacional de Remédios, de outro lado. A falha na distribuição dos remédios faz com que muitos deles percam o prazo de validade e são jogados fora. Dois órgãos fazendo a mesma coisa só pode resultar em confusões. Lembro-me do INDA e do IBRA atuando no setor de reforma agrária. Um órgão empurrava os problemas agrários para outro órgão, ficando ambos sem dar execução até que foram extintos por atrapalharem a política de reforma agrária.
Outro exemplo na área da saúde: equipamentos médicos importados a peso de ouro estão mofando e enferrujando, porque a unidade de saúde que encomendou está em reformas, ou encerrou suas atividades. Não há logística capaz de redirecionar esses equipamentos para outras unidades; ficam à espera da criação de um órgão redistribuidor de equipamentos médicos ociosos. É muita falta de vontade política.
A morosidade na aprovação de leis orçamentárias, também, contribui para a desorganização das finanças públicas.
As leis do PPA, da LDO e da LOA são invariavelmente aprovadas com atrasos. Temos casos em que a LDO, que serve para orientar a elaboração da proposta orçamentária anual, foi aprovada quase que simultaneamente com a LOA.
É evidente que no caso, a LOA não estará refletindo as metas e prioridades apontadas na LDO, ficando bem longe da realidade social.
Outras vezes a LOA é aprovada depois de decorridos longos meses do exercício em curso, obrigando o Executivo a fazer despesas sem previsão legal, concorrendo para a desorganização das finanças públicas.
Por conta desse atraso, às vezes, a LOA é executada de forma diferente do que a prevista na lei orçamentária, ou até mesmo de forma invertida.
Outro mecanismo de desmontagem do orçamento público é a Desvinculação de 30% das Receitas da União.
Implantou-se na prática a realização de despesa pública à discrição do governante e não segundo o princípio da legalidade das despesas públicas. Esses gastos discricionários não são suscetíveis de fiscalização e controle pelo TCU por ausência dos elementos de despesa.
Pode-se dizer que a DRU se constitui em uma fonte de corrupção administrativa.
É preciso que o Ministério Público e o Judiciário passem a responsabilizar os violadores da Lei Orçamentária Anual.
Existe a Lei de Responsabilidade Fiscal – LRF – destinada a tutelar a gestão fiscal responsável, mas o que se vê na prática é a gestão fiscal irresponsável, desperdiçando verbas públicas sem qualquer punição do responsável.
Outrossim, para tutelar a LRF existe a Lei nº 10.028/2000 sancionada simultaneamente com a Lei Complementar nº 101/2000 definindo os crimes contra a ordem financeira que até hoje parece não ser do conhecimento do Ministério Público.
É preciso que as autoridades públicas responsáveis deem cumprimento às normas destinadas à proteção de verbas públicas.
II – Informativo
STF valida prova obtida em celular sem ordem judicial
Na sessão do dia 25-6-2025 o STF fixou a tese de que a prova obtida pela polícia, a partir da apreensão e dos dados armazenados no celular encontrado no local do crime, é válida, ainda que sem a autorização judicial (ARE nº 1.042.075)
Fixação do valor da alçada para fins recursais
O STJ fixou tese, sob o rito de recursos repetitivos (Tema 1.248), no sentido de que para o efeito de apelação em execução fiscal fundada em uma única CDA composta de diferentes tributos, o valor da alçada para aferição do cabimento do recurso de apelação deve ser calculado sobre o montante total da dívida, e não de forma individualizada (Resp nº 2.077.135; Resp nº 2.077.138; Resp nº 2.077.319; e Resp nº 2.077.461)
Culpa in vigilando
A 3ª Turma do STJ condenou uma clínica psiquiátrica e a operadora do plano de saúde pelo suicídio de paciente internada sob cuidados médicos intensivos.
A Turma julgadora entendeu que a omissão da clínica foi determinante do suicídio (Resp nº 2.166.585).
Devolução de honorários em ação rescisória
A 3ª Turma do STJ consolidou entendimento no sentido de que o advogado, que não integrou o polo passivo em ação rescisória, não pode ser atingido na fase de execução do julgado (Resp nº 2.139.824)
A 1ª Turma do STJ julga a questão da pejotização suspensa em âmbito nacional por decisão do Ministro Relator, Gilmar Mendes.
O Ministro Gilmar Mendes reconheceu a repercussão geral no Tema 1.389 determinando a suspensão de processos que tratam da caracterização de vínculo em relações de trabalho mediadas por plataformas digitais.
A 1ª Turma do STF entendeu que a suspensão nacional determinada no Tema 1.189 não atinge os processos em tramitação no próprio STF (Recl nº 73.242).
SP, 30-6-2025.