Como se sabe, a partir do exercício de 2015 o lançamento do IPTU está sujeito à trava de 10% em relação ao exercício anterior, por força do disposto no art. 9º da Lei nº 15.889/2013.

Não cuidaremos neste artigo do exame da Lei nº 17.719/2021 que flexibilizou o emprego da trava por não ser pertinente ao tema abordado.

Dispõe o art. 9º da Lei nº 15.889/2013:

 

“Art. 9º A diferença nominal entre o crédito tributário total do IPTU do exercício do lançamento e o do exercício anterior fica limitada:

I – no caso de imóveis com utilização exclusiva ou predominantemente residencial, a 20% (vinte por cento) para fatos geradores ocorridos no exercício de 2014 e a 10% (dez por cento) para fatos geradores ocorridos nos demais exercícios;

II – nos demais casos, a 35% (trinta e cinco por cento) para fatos geradores ocorridos no exercício de 2014 e a 15% (quinze por cento) para fatos geradores ocorridos nos demais exercícios”.

 

Como se verifica, a aplicação do redutor de 10% fica na dependência da existência de lançamento do exercício anterior.

Aqui reside toda a dificuldade de ordem prática.

Como proceder a apuração da base de cálculo de prédio novo?

Pela lógica a Prefeitura deveria lançar mão dos dados da PGV que disponibiliza o valor unitário de metro quadrado do terreno conforme sua localização, topografia etc. e o valor unitário do metro quadrado da construção conforme o tipo de construção e o seu padrão construtivo, tudo de conformidade com a Lei nº 10.235 de 16-12-1986.

Nesses casos, a astuta Prefeitura paulistana vem procedendo à apuração do valor venal segundo o valor de mercado, valendo-se da conceituação doutrinária, segundo a qual valor venal é o preço que seria alcançado no mercado em condições normais do mercado imobiliário, admitida a diferença de 10% para mais ou para menos.

Contudo, o valor venal do imóvel para fins de lançamento do IPTU não se confunde com o preço do imóvel praticado do mercado.

Consoante escrevemos, o “conceito doutrinário de valor venal é mero parâmetro de que se serve o legislador para elaboração de lei definindo critérios objetivos para a apuração do valor unitário do metro quadrado da construção e do terreno, considerando os diferentes tipos e padrões de construção, bem como sua localização nas diferentes zonas fiscais em que se subdivide a zona urbana do Município”

O lançamento é ato administrativo vinculado (parágrafo único do art. 142 do CTN).

Não fica a critério da autoridade de administrativa lançadora do imposto para buscar o valor de cada imóvel, mediante pesquisa de mercado, tarefa cabente ao legislador que com base nas pesquisas fixa o valor do unitário do metro quadrado do terreno e da construção.

A definição da base de cálculo está sob reserva lei (art. 97, IV do CTN). Não cabe ao lançador apurar concretamente o valor venal de cada imóvel, mas, tão somente enquadrar cada imóvel nas características previstas na Lei nº 10.325/86, efetuando os cálculos aritméticos segundo os valores unitários do metro quadrado do terreno e da construção consignados na PGV, fato que retira toda a subjetividade da autoridade lançadora do IPTU.

Por se tratar de lei de iniciativa do Executivo cabe a este Poder consignar na proposta legislativa esses valores unitários resultantes da pesquisa imobiliária para que o legislador possa aprovar as PGVs.

Na realidade, o Município vem procedendo ao arbitramento da base de cálculo do prédio novo com base, provavelmente, na pesquisa imobiliária, sem o devido processo legal, deixando de aplicar a própria legislação que editou.

Ora, o art. 148 do CTN exige a formalidade do devido processo legal para arbitramento da base de cálculo de tributos, vale dizer, exige a observância do contraditório e ampla defesa.

A municipalidade de São Paulo inverte a ordem prevista no art. 148 do CTN.

Primeiro arbitra unilateralmente e, ao depois, assegura ao contribuinte a avaliação contraditória.

Se a questão for levada a juízo haverá necessariamente nomeação de perito para a apuração do valor venal do imóvel.

Lamentavelmente, não há, por ora, nenhum perito habilitado para proceder à apuração do valor venal de conformidade com as normas da Lei nº 10.235/86 que aprovou a PGV.

Invariavelmente, todo perito procura encontrar o valor venal por meio de pesquisas de mercado, mediante utilização do método comparativo, como se estivesse encontrado o valor da justa indenização a ser paga em caso de desapropriação do imóvel.

Esse fato faz com que a base de cálculo do IPTU supere o valor venal que resulta da aplicação da lei de regência da matéria.

Como é sabido, o valor de mercado é bem superior ao valor venal que serve de base para o lançamento do IPTU.

Ninguém, certamente, venderia o seu imóvel pelo valor venal expresso na notificação de lançamento tributário.

Deficiência de ordem prática faz com que a impugnação do lançamento do IPTU por extrapolar o valor venal que resultaria da aplicação da PGV, resulte em desfavor do impugnante.

A esperta Prefeitura paulistana sabe disso, por isso, em caso de impugnação do lançamento pelo contribuinte deixa de aplicar a sua lei de regência, para arbitrar o valor venal unilateralmente com base em pesquisa de mercado.

 

SP, 13-2-2023

[1] Com o advento da Lei nº 17.719/2021 o redutor de 10% ficou valendo para todos os imóveis, residenciais ou não residenciais para os exercícios de 2022 a 2024 (§§ 6º e 7º do art. 9º com as alterações introduzidas).

[2] Cf. nosso CTN comentando, 6ª ed. São Paulo: Rideel, 2021, p.53