KiyoshiHarada
Sumário: 1 Introdução. 2 Análise da questão. 3 Conclusão.
1 Introdução
Como é do conhecimento de todos, o art.25, § 9º do Decreto nº 70.235/72, que rege o processo administrativo tributário no âmbito da União,estabelecia que em caso de empate nas votações proferidas pelas Câmaras e Turmas terá lugar o voto de qualidade a ser proferido pelo Presidente da Câmara ou da Turma:
“§ 9º Os cargos de Presidente das Turmas da Câmara Superior de Recursos Fiscais, das Câmaras, das suas turmas especiais serão ocupados por conselheiros representantes da Fazenda Nacional, que, em caso de empate, terão o voto de qualidade, e os cargos de Vice-Presidente, por representantes doscontribuintes.”
Ocorre queo art. 28 da Lei nº 13.988, de 14-4-2020, fruto de conversão da MP nº 899/2019 que instituiu a transação tributária, acrescentouo art. 19-E à Lei nº 10.522, de 19-7-2002 prescrevendoque em caso de empate não se aplica o voto de qualidade, resolvendo-se a questão favoravelmente ao contribuinte.
Passou-se de um extremo a outro.
Impugnando esse novo dispositivo foram ajuizadas as ADIs nºs 6.399, 6.403 e 6.415.O Ministro Marco Aurélio, relator do processo, entendeu que a lei questionada padece de abuso do poder de emenda, pela prática de “contrabando legislativo” popularmente conhecido por Jabuti.
Contudo, o ilustre Ministro afastou o vício material porque no seu entender a lei impugnada não criou o voto de qualidade em benefício do contribuinte; apenas definiu que, se não há maioria no colegiado do CARF, não se tem confirmado o lançamento do tributo.
No nosso modo de ver não há norma contrabandeada, pois, existe uma conexão entre a transação tributária, objeto original da MP nº 899/2019, e o novo critério de desempate, pois ambos conduzem à extinção do litígio tributário na área administrativa (art. 156, III e IX do CTN).
2 Análise da questão
Surgiu a tese da prevalência da posição favorável ao contribuinte em decorrência da ADI nº 5.731/DF impetrada pelo Conselho Federal da OAB para ver declarada a inconstitucionalidade do citado § 9º, do art. 25 da Decreto nº 70.235/72, e mediante interpretação conformeparadeterminar que em caso de empate se aplique a tese que for favorável ao contribuinte, na esteira do que dispõe o art. 112 do CTN.
Após o voto do Relator, Ministro Marco Aurélio, pela inconstitucionalidade formal do art. 19-E da Lei nº 10.522, de 19-7-2002 introduzido pelo art. 28 da Lei nº 13.988, de 14-4-2020, o Ministro Roberto Barros afastou a inconstitucionalidade formal e, no mérito, negou provimento à ADI julgando válido o art. 28 da Lei nº 13.988/2020. Acrescentou, contudo, que nesse caso fica facultado à Fazenda ingressar com ação judicial.
O julgamento foi suspenso com o pedido de vista do Ministro Alexandre de Morais.
Na sessão plenária do dia 24-3-2022 o Ministro Alexandre de Moraes proferiu o seu voto afastando a inconstitucionalidade formal e, também, a inconstitucionalidade material, fazendo prevalecer a tese favorável ao contribuinte. Afastou a possibilidade de a Fazenda recorrer ao Judiciário, porque se o próprio órgão administrativo da Fazenda Pública decidiu de forma favorável ao contribuinte extinguindo o crédito tributário, não teria sentido ela própria buscar a alteração do julgado pela via judicial.
Pediu vista o Ministro Nunes Marques.
Porém, anteciparam seus votos acompanhando o voto do Ministro Alexandre de Moraes os seguintes Ministros: Min. Edson Fachin, Min. Cármen Lúcia e Min. Ricardo Lewandowski.
Até agora temos cinco votos favoráveis à validade material do art. 28 da Lei nº 13.988/2020 que estabeleceu a tese favorável ao contribuinte em caso de empate de votação perante o CARF, sendo que o Min. Marco Aurélio votou pela inconstitucionalidade formal desse artigo 28, resultado de MP em que houve contrabando legislativo. Porém, assegurou que se vencido na preliminar, no mérito julgava válido o citado artigo.
Faltam votar mais cinco Ministros: Min. Nunes Marques, Min. Gilmar Mendes, Min. Rosa Weber, Min. Dias Tóffoli e Min. Luiz Fux.
3 Conclusão
A tendência da Corte Suprema é pela constitucionalidade formal e material do dispositivo legal impugnado e, também, pelo afastamento do posicionamento adotado pelo Min. Roberto Barroso de facultar o ingresso da Fazenda perante o Judiciário para impugnar a decisão administrativa favorável ao contribuinte.
Essa tese, na verdade, minimiza o processo administrativo tributário permitindo que as decisões do CARF, um órgão administrativo da Fazenda, sejam atacadas por um outro órgão da mesma Fazenda, a Procuradoria Geral da Fazenda Nacional.
No âmbito de sua competência a decisão do CARF vale tanto quanto a decisão do Judiciário. Nesse sentido fala-se em coisa julgada administrativa.
Somente quando contrária ao contribuinte é que cabe a este bater as portas do Judiciário, em virtude do princípio da inafastabilidade da jurisdição inserto no inciso XXXV, do art. 5º da CF, para afastar qualquer lesão ou ameaça a direito por parte do poder público.
SP, 28-3-2022.