A tributação da economia digital é matéria que vem chamando a atenção não apenas dos estudiosos do direito tributário internacional, mas também de líderes de governo, ante à dificuldade de arrecadação de tributos neste âmbito.
O plano BEPS1 – Base Erosionand Profit Shifting – desenvolvido pela OCDE foi um dos primeiros movimentos internacionais a fim de identificar os problemas da tributação internacional em razão da dificuldade da aplicação de regras originalmente voltadas às empresas que possuíam estabelecimentos físicos, bem como operavam com bens tangíveis.
Com as múltiplas possibilidades de operações em âmbito virtual, realizando a negociação de bens intangíveis em sua maioria, a movimentação financeira de empresas que atuam majoritariamente nestes ramos, acabou por atingir cifras bilionárias, como já veiculado por diversos meios de comunicação2 internacionais.
Posto isso, tomamos como premissa para uma breve análise as operações do Google no Brasil, de modo a compreender um pouco melhor como o marketing digital é desenvolvido e como é realizada a tributação deste no país.
Importa comentar que não é objetivo dos presentes comentários exaurir toda a temática voltada à tributação do marketing digital no Brasil, mas apenas contribuir com a compreensão deste, bem como da necessidade de organização de um sistema tributário mais ativo e atento às inovações tecnológicas. Ainda, não faremos distinção entre marketing e publicidade e propaganda, visto que para fins da presente, serão tratados como sinônimos. Por último, focaremos em tratar das atividades pelo Google, empresa de maior expressividade no ramo de atuação.
Atualmente, o Google oferece modalidades de marketing digital, utilizadas em todo o mundo. Em resumo, as ferramentas mais utilizadas são: a) banners; b) links patrocinados – também conhecidos como “pay per click”.
Os banners são ferramentas mais antigas oferecidas pela empresa. Basicamente consistem nos pequenos quadros apresentados nos cantos superiores, inferiores e laterais dos sites. Trata-se de uma modalidade de marketing digital, vez que cria uma conexão entre a página do anunciante e do site parceiro, vez que o usuário da internet, se interessado, poderá ser direcionado diretamente ao site do anunciante se clicar nos banners.
Por sua vez, os links patrocinados, também conhecidos como pay per click, são ferramentas mais modernas, desenvolvidas a partir da plataforma do Google AdWords e AdSense.
O AdWords3 é uma ferramenta para publicações de anúncios, garantindo maior assertividade nas aparições de buscas, assim como garantindo maior possibilidade do alcance dos anúncios.
Como o próprio Google explica, o usuário pode criar mensagens personalizadas em seus anúncios e também definir o alcance destes. Tudo isso com orçamento definido previamente, em valor bastante inferior ao serviço tradicional.
O serviço AdSense veio a complementar o anterior, visto que consegui expandir os anúncios contratados no AdWords para diversos sites que utilizem o sistema de pesquisa Google. Portanto, passou a existir uma espécie de relação tripla onde o anunciante contrata os serviços de anúncios do Google e este, por sua vez, paga contraprestação aos seus sitesparcerios – que servirão como display.
Foram a partir destas ferramentas que os anúncios começaram a possuir mais “inteligência”, vez que acabam relacionando diversas informações para suas aparições, o que acabou por facilitar a compreensão de gosto do usuário da rede.
Ultrapassada esta breve análise introdutória das modalidades mais usuais de marketing digital no Brasil, passaremos a delinear seus aspectos tributários debatidos atualmente.
2. Dos aspectos tributários e da necessidade de uma reforma tributária digital
Primeiramente, é importante ressaltar que pelo menos nos últimos três anos, quando se trata da tributação de bens digitais, especialmente o ICMS e o ISS passaram a ter uma linha muito tênue – para não dizer inexistente – acerca de suas diferenças para consumação do fato gerador.
É inegável que a disputa arrecadatória entre estados e municípios nãoé nova. Consequentemente não seria diferente para a possibilidade de arrecadação em operações digitais.
Muito se discutiu acerca da eventual incidência do ICMS ou ISS sobre os as operações envolvendo o marketing digital, vez que não havia uma natureza jurídica própria definida.
Havia discussões se tais operações seriam realizadas a partir da utilização de softwares em nuvem, configurando tão somente a utilização do usuário, ou então se este viria a ser uma nova modalidade de serviço digital, decorrente da evolução da tecnologia.
Para lançarem-se à frente, os estados se reuniram no CONFAZ para a edição dos Convênios números 181/15 e 106/17, os quais preveem a incidência do imposto estadual sobre operações envolvendo programas digitais, arquivos eletrônicos, aplicativos, dentro outros, disponibilizados sob qualquer meio.
Este movimento também representou uma inovação para o campo de incidência do ICMS, visto que busco superar o fator da circulação física de mercadorias, considerando que a circulação através de digital clouds – nuvens, comumente chamadas – também sofreriam a incidência do imposto.
Ato contínuo, os representantes dos municípios conseguiram a aprovação no Congresso Nacional da Lei Complementar 157/2016, alterando a lista de serviços anexas à Lei Complementar 116/2003, passando a prever uma série de novos serviços oriundos das novas tecnologias.
Dentre essa inovação legislativa, foi inserido o item 17.25, garantindo aos municípios a competência para tributar as atividades de marketing, em geral, realizadas via internet.
Isto posto, restou assentada a tal controvérsia, tendo alguns estados – como São Paulo através da Portaria CAT n. 24/18 – realizado alterações legislativas para poderem definir melhor sua competência de tributação de bens digitais.
Apesar de dirimidos maiores conflitos e dúvidas acerca deste ponto específico da economia digital, é evidente que os entes federados brasileiros se socorrem a alterações legislativas simplistas e pouco efetivas para garantir a tributação destas inovações tecnológicas.
Em que pese a tecnologiacaminhar a passos muito mais largos que a legislação brasileira, é assaz relevante que sejam adotados novos modelos de tributação para que o sistema indireto seja mais efetivo e menos defasado ante tais inovações.
A defasagem do modelo de tributação indireta brasileira frente à economia digitalnão só traz malefícios à arrecadação plena, mas também acaba ensejando em mais disputas entre municípios e estados.
Ressalta-se que ainda que tenha se definido pela aplicação do ISS como devido nestas operações, há doutrinadores e especialistas que compreendem que o imposto não possui espectro constitucional necessário à sua aplicação, trazendo como possibilidade a utilização da competência residual da União para tributação dos meios digitais.
Diversos países têm se organizado para alterarem sua forma de tributação em operações digitais, visto que a legislação vigente até então, de fato, acaba por se tornar obsoleta. No caso de negócios de marketing digital com o Google, a empresa disponibiliza4 espécie de perguntas e respostas para indicar a tributação incidente em cada país.
No documento não há menção ao Brasil, até porque diferente dos outros países, a forma de negócio desenvolvido com o Google acaba por ser diferente. Contudo, da análise do documento, é possível verificar que países como Argentina, Índia, Austrália e outros, já se organizaram para modelar sua tributação, de modo que o campo de incidência dos tributos seja alterado para que possua um espectro diferente do tradicional.
Neste sentindo, ainda que o Brasil encontre meios de ajustar seu modelo de tributação indireta, o cenário atual apresenta uma real necessidade de uma análise mais profunda e efetiva.
1 Para maiores informações acerca do BEPS: https://www.oecd.org/tax/beps/