“Por influência da Worten, à qual comprámos, em Leiria, dois computadores pessoais, ligámo-nos ao Universo (banco?), já que nos convenceram das vantagens de pagar, “sem juros” e a prestações suaves, a aquisição.

Tudo “certo” até aqui.

Depois é que foi o “cabo dos trabalhos”: o Universo começou a facturar “à fartazana” determinados valores, no documento apresentado a pagamento, sistematicamente, com a estranha indicação de “fim do mês”…

Ao darmo-nos conta deste desvio, reclamámos, reclamámos. Como reacção: “se não pagar, notificamos o Banco de Portugal para a inclusão na Lista dos Maus Pagadores”, vulgo, Lista dos “Caloteiros”. Com todas as consequências, nomeadamente, o ficar-se, bem entendido, com o “nome SUJO” na praça!

O Universo nem emenda a mão nem nos responde: como proceder?”

Ante os factos relatados, a solução que se nos afigura a correcta:

 

  1. Quem cobra o que não deve comete o crime de especulação: Lei Penal do Consumo – LPC de 20 de Janeiro de 1984.

 

  1. Com efeito, no seu artigo 35, a LPC dispõe como segue:

“1 - Será punido com prisão de 6 meses a 3 anos e multa não inferior a 100 dias quem:

a) Vender bens ou prestar serviços por preços superiores aos permitidos pelos regimes legais a que os mesmos estejam submetidos;

b) Alterar, sob qualquer pretexto ou por qualquer meio e com intenção de obter lucro ilegítimo, os preços que do regular exercício da actividade resultariam para os bens ou serviços ou, independentemente daquela intenção, os que resultariam da regulamentação legal em vigor;

c) Vender bens ou prestar serviços por preço superior ao que conste de etiquetas, rótulos, letreiros ou listas elaborados pela própria entidade vendedora ou prestadora do serviço;

d) Vender bens que, por unidade, devem ter certo peso ou medida, quando os mesmos sejam inferiores a esse peso ou medida, ou contidos em embalagens ou recipientes cujas quantidades forem inferiores às nestes mencionadas.

…”

  1. Para além de uma tal conduta tipificar uma infracção criminal, há também na circunstância uma prática desleal, que importa revelar. A Lei das Práticas Comerciais Desleais – LPCD, na alínea c) do seu art.º 12 estatui:

“São consideradas agressivas, em qualquer circunstância, as seguintes práticas comerciais:

… Fazer solicitações persistentes e não solicitadas, por telefone, fax, e-mail ou qualquer outro meio de comunicação à distância, excepto em circunstâncias e na medida em que tal se justifique para o cumprimento de obrigação contratual…”

  1. O ilícito de mera ordenação social, no passo precedente recortado, é passível de coima, ao qualificá-lo a lei como contra-ordenação económica grave: LPCD - n.º 1 do art.º 21.

 

  1. A dar de barato que se trata de uma média empresa (com não mais de 249 trabalhadores), a coima, de harmonia com o Regime Jurídico das Contra-Ordenações Económicas de 29 de Janeiro de 2021, oscilará entre 8 000,00 a 16 000,00 € (DL 9/2021: subal. IV daal. b) do art.º 18).

 

  1. Importa reforçar a reclamação na Livro respectivo (papel ou suporte electrónico), remetendo, se for o caso, o duplicado ao Banco de Portugal, em reforço da diligência, para actuação subsequente.

EM CONCLUSÃO

  1. A cobrança de valor superior ao pactuado constitui crime de especulação, previsto e punido pela LPC e cominado com prisão de seis meses a três anos e multa não inferior a 100 dias (DL 28/84: al. b) do n.º 1 do art.º 35).

 

  1. A insistência para pagamento de montante não devido constitui, em rigor, prática comercial agressiva passível de coima em conformidade com o que estatui a LPCD (DL 57/2008: al. c) do art.º 12; n.º1 do art.º 21).

 

  1. A coima oscila entre os 8 000 e os 16 000 €, tratando de média empresa (até 249 trabalhadores) (DL 09/21: subal. IV da al. b) do art.º 18).

 

Tal é, salvo melhor juízo, o nosso parecer.

Mário Frota

presidente emérito da apDC – DIREITO DO CONSUMO - Portugal