De um leitor de Salvaterra de Magos
“Comprei recentemente um aquecedor numa grande superfície. Após um mês de uso avariou. Na loja pediram-me para o deixar para reparação. O que é certo é que já está para reparar desde Novembro. E não me dão informações sobre o que se passa. Na loja dizem apenas que está em reparação. Sem se comprometerem com uma data para a entrega. Pergunto se não existe um prazo legal para uma resposta ou devolução.”
Protelar a reparação
Como sinal de ineficácia
É crassa violação
Que bem lembra SANTA ENGRÁCIA!
Ante a factualidade relatada, cumpre oferecer o enquadramento jurídico:
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Com efeito, a Lei da Compra e Venda dos Bens de Consumo [DL 84/2021, de 18 de Outubro], reza, com todas as cautelas, no seu artigo 18 (n.º 2), sob a epígrafe “reparação ou substituição do bem”:
“1 — …
2 — A reparação ou a substituição do bem é efectuada:
a) A título gratuito;
b) Num prazo razoável a contar do momento em que o profissional tenha sido informado pelo consumidor da falta de conformidade;
c) Sem grave inconveniente para o consumidor, tendo em conta a natureza dos bens e a finalidade a que o consumidor os destina.
2. Ora, a “título gratuito” quer significar, como o refere a alínea a) do n.º 2 do diploma legal respectivo:
“livre dos custos necessários incorridos para repor os bens em conformidade, nomeadamente o custo de porte postal, transporte, mão-de-obra ou materiais”.
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“Prazo razoável” é o que o n.º 3 do enunciado artigo concretiza:
“O prazo para a reparação ou substituição não deve exceder os 30 (trinta) dias, salvo nas situações em que a natureza e complexidade dos bens, a gravidade da não conformidade e o esforço necessário para a conclusão da reparação ou substituição justifiquem um prazo superior.”
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Importa, porém, não olvidar que:
“4 — Em caso de reparação, o bem reparado beneficia de um prazo de garantia adicional de seis meses por cada reparação até ao limite de quatro reparações, devendo o profissional, aquando da entrega do bem reparado, transmitir ao consumidor essa informação.
5 — Quando a reparação exigir a remoção do bem que tenha sido instalado de uma forma compatível com a sua natureza e finalidade antes de a falta de conformidade se ter manifestado, a obrigação do fornecedor abrange a remoção do bem não conforme e a instalação de bem reparado ou substituto, a suas expensas.
6 — Havendo substituição do bem, o fornecedor é responsável por qualquer falta de conformidade que ocorra no bem sucedâneo, nos termos do disposto no artigo 12.º
7 — Em caso de substituição do bem, não pode ser cobrado ao consumidor qualquer custo inerente à normal utilização do bem substituído.”
4. Nos termos do artigo 48 da Lei da Compra e Venda dos Bens de Consumo, a violação do disposto nos n.ºs 2, 3, 4, 5 e 7 do artigo 18.º, que assinalámos precedentemente, constitui contra-ordenação grave.
5. A moldura contra-ordenacional é, por conseguinte, a que segue:
Tratando-se de
o Microempresa (até 9 trabalhadores), de 1 700,00 a 3 000,00 €;
o Pequena empresa (de 10 a 49), de 4 000,00 a 8 000,00 €;
o Média empresa (de 50 a 249), de 8 000,00 a 16 000,00 €;
o Grande empresa (de 250 ou mais) de 12 000,00 a 24 000,00 €.
6. Convém lavrar no Livro de Reclamações o facto que servirá de base à ASAE para a instrução dos autos, se for o caso, e para infligir a sanção que na circunstância couber.
EM CONCLUSÃO
a. O prazo para a reposição de conformidade, em caso de reparação, é de 30 (trinta) dias.
b. Porém, obtempera a lei, excepcionando que “as situações em que a natureza e complexidade dos bens, a gravidade da não conformidade e o esforço necessário para a conclusão da reparação… [justificam] um prazo superior.”
c. O fornecedor terá de fundamentar convenientemente as situações que caibam na excepção, reverberando-se que cerca de três meses volvidos após ter passado a dispor do bem (para reposição da conformidade) se não haja ainda manifestado de modo adequado e preciso.
d. O incumprimento do prazo constitui ilícito de mera ordenação social passível de coima de acordo com a grelha apresentada em 6.
e. A situação deve ser objecto de reclamação no Livro respectivo para efeitos legais.
Eis, salvo melhor juízo, o nosso parecer.
Mário Frota
presidente emérito da apDC- DIREITO DO CONSUMO – Portugal
Obs.
A expressão “como as obras de Santa Engrácia”, comum na língua corrente, é utilizada para referir-se a algo que não chegará a acontecer, ou que demorará muito a acontecer.