COMPROMETIDA A ENTRADA EM VIGOR DA LEI

SOBRE CLÁUSULAS ABUSIVAS POR INTOLERÁVEL OMISSÃO DO GOVERNO

Mario Frota*

Os contratos de ADESÃO

De letras miúdas tecidos

São fonte de inquietação

Pelos ardis nelas escondidos

II

É que as letras miudinhas

Causam funda turvação

São como que ervas-daninhas

A reclamar supressão!

Eis o que em tema de “cláusulas abusivas” houve por bem, mas por portas travessas, o Parlamento legislar:

Lei n.º 32/2021
27 de Maio

Artigo 1.º

Objecto

A presente lei procede à quarta alteração do Decreto-Lei n.º 446/85, de 25 de Outubro, que institui o regime jurídico das cláusulas contratuais gerais,

proibindo

  • as cláusulas redigidas com tamanho de letra inferior a 11 ou a 2,5 milímetros e com um espaçamento entre linhas inferior a 1,15, e
  • prevendo a criação de um sistema de controlo e prevenção de cláusulas abusivas.

Artigo 2.º

Alteração ao Decreto-Lei n.º 446/85, de 25 de Outubro

O artigo 21.º do Decreto-Lei n.º 446/85, de 25 de Outubro, passa a ter a seguinte redacção:

«Artigo 21.º

(Cláusulas absolutamente proibidas)

São em absoluto proibidas, designadamente, as cláusulas contratuais gerais que:

… … … … …

  • Se encontrem redigidas com um tamanho de letra inferior a 11 ou a 2,5 milímetros, e com um espaçamento entre linhas inferior a 1,15».

Artigo 3.º

Regulamentação e sistema de controle e prevenção de cláusulas abusivas

1 - O Governo regulamenta o presente diploma no prazo de 60 dias [até 26 de Julho de 2021].

2 - A regulamentação a que se refere o número anterior inclui a criação de um sistema administrativo de controlo e prevenção de cláusulas abusivas,garantindo que as cláusulas consideradas proibidas por decisão judicial não são aplicadas por outras entidades.

Artigo 4.º

Entrada em vigor

A presente lei entra em vigor 90 dias após a sua publicação [25 de Agosto de 2021].”

O que fez a Lei, em suma?

  • Regulamentou a alínea c) do artigo 8.º do DL 446/85, de 25 de Outubro (a apresentação gráfica das cláusulas) (ainda que fora de contexto, já que predispôs o preceito em artigo aplicável tão só às “relações com os consumidores finais”).
  • Conferiu eficácia erga omnes às decisões proferidas nas acções inibitórias.
  • Criou o que pode considerar-se uma Comissão das Cláusulas Abusivas em vista do controlo e prevenção das condições gerais apostas nos formulários de adesão.

O facto é que o Governo deveria ter legislado até 26 de Julho, isto é, até cerca de finais do mês transacto cumprir-lhe-ia, em diploma legal apropriado, regulamentar:

  • Os aspectos inerentes ao corpo e tamanho de letra e aos espaços entre linhas, de molde a uniformizar o regime às mais hipóteses em que a disciplina das condições gerais dos contratos se aplica
  • A eficácia erga omnes das decisões proferidas nas acções inibitórias.
  • A constituição da Comissão das Cláusulas Abusivas.

E o facto é que, vencida a primeira quinzena de Agosto, ainda o não fez.

Nem houve sequer, quanto se julga, eventual consulta ao Conselho Nacional do Consumo.

E, no entanto, a lei emanada do Parlamento entra em vigor dentro de cerca de uma semana [25 de Agosto em curso].

O Governo não cumpre.

Os consumidores padecem.

Que medidas encetar para que o Governo cumpra o que lhe cabe nesta parte?

Que responda quem souber!

* apDC – DIREITO DO CONSUMO - Coimbra