“Andava para aí uma empresa, travestida de associação de consumidores (a deco-proteste, lda.),a convencer toda a gente de que a troca de brindes, pelo Natal ou em outras épocas festivas, era um mero favor dos comerciantes, que bem podiam recusar-se a fazê-lo porque nada na lei os obrigaria”.
Formulada a questão, eis o que se nos afigura a propósito:
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Na ausência de regra expressa no ordenamento jurídico de consumo, há que recorrer supletivamente ao Código Civil.
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Nele se disciplina quer a venda a contento quer a venda sujeita a prova.
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A ‘venda a contento’ é feita sob reserva de a coisa agradar ao consumidor; a ‘venda sujeita a prova’sob condição de a coisa ser idónea para o fim a que se destina e ter as qualidades pelo vendedor asseguradas.
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A ‘venda a contento’ [Código Civil: art.ºs 923 s] reveste duas modalidades:
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a primeira, como mera proposta de venda: a proposta considera-se aceita se, entregue a coisa ao consumidor, este se não pronunciar dentro do prazo da aceitação (8, 10, 15 dias, o que se fixar); neste caso, não haverá pagamento porque não há contrato, mas mera entrega do valor da coisa, a título de caução.
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a segunda, como contrato: há já um contrato e não uma mera proposta contratual, a que se porá termo se a coisa não servir ao consumidor ou a terceiro, se não for idónea para o fim a que se destina; devolvida a coisa, restituir-se-á na íntegra o preço.
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Em caso de dúvida, presume-se que é a primeira a modalidade adoptada: a da proposta contratual.
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A ‘venda sujeita a prova’ [Código Civil: art.º 925] depende, em princípio, de uma condição suspensiva: i., é, aquela segundo a qual as partes subordinam a um acontecimento futuro e incerto a produção dos efeitos do negócio; se servir, se for idónea, o negócio produz os seus efeitos normais, se, pelo contrário, o não for, o contrato extingue-se.
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A prova deve ser feita dentro do prazo e segundo a modalidade estabelecida pelo contrato ou pelos usos que têm valor legal.
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Mas, na circunstância, poderá haver ainda o recurso ao ‘princípio da autonomia da vontade’ [Código Civil: art.º 406], em cujo n.º 2, sob a epígrafe “liberdade contratual”, se diz:
“As partes podem ainda reunir no mesmo contrato regras de dois ou mais negócios, total ou parcialmente regulados na lei.”
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E o facto é que os contratos celebrados nestas circunstâncias (e é essa a vontade dos contraentes, fundidas em negócio jurídico que – se assim não fora – nem os consumidores comprariam nem os comerciantes venderiam) são-no com a faculdade de troca em um dado período de tempo (que outrora fora de oito dias, pelo recurso paralelo ao prazo do proémio do artigo 471 do Código Comercial, que, de resto, constava das notas emitidas pelos estabelecimentos).
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Contrato que é um híbrido da venda a contento ou da venda sujeita a prova com consequências menos gravosas para o comerciante que os verdadeiros e próprios contratos típicos, nominados, como supra se definem, com a faculdade de troca do bem, já que se pactua a substituição da coisa que não a sua devolução pura e simples com a restituição do preço ao consumidor.
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Não se fale, pois, em favor ou em mera cortesia nem se diga que os fornecedores não estão obrigados a efectuar as trocas com as consequências daí emergentes: porque, em termos tais, a isso se obrigam, sem quaisquer reticências.
EM CONCLUSÃO
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A “troca” de brindes, quiçá, a sua devolução, não constituem meros favores dos comerciantes, das empresas, antes é algo que emerge dos contratos firmados ou com a marca da lei ou no quadro da autonomia dos contraentes.
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Ou se trata de um contrato de venda a contento (“ad gustum”) feito sob reserva de a coisa agradar ao consumidor (Código Civil: art.ºs 923 e ss).
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Ou de um contrato de venda sujeita a prova que depende, em princípio, de uma condição segundo a qual o negócio se torna perfeito se a coisa servir, se for idónea para o fim a que se destina (Código Civil: art.º 925).
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O efeito será sempre o da devolução da coisa e o da restituição do preço.
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Se se tratar de um contrato celebrado em vista, não da devolução da coisa e da restituição do preço, antes da sua substituição, segundo os usos (com valor de lei), é-o no âmbito da autonomia da vontade das partes que podem modelar os contratos a seu bel talante(Código Civil: art.º 406).
Tal é, salvo melhor juízo, o meu parecer.
Mário Frota
presidente da apDC – DIREITO DO CONSUMO -, Portugal.