Podem as empresas de comunicações electrónicas pelos contactos estabelecidos pelos consumidores cobrar por chamada telefónica um qualquer valor acrescentado?

É que essa forma de proceder desencoraja as pessoas, sobretudo se as chamadas forem propositadamente demoradas e os valores facturados muito elevados.

Os consumidores poderão reclamar de tais práticas?”

 

Cumpre apreciar e responder

  1. Perante abusos tamanhos, de há muito que a Provedora de Justiça, como se destaca de um dos seus comunicados, se pronunciara ao detectar que havia significativos desvios por parte de diversos serviços públicos — a saber, Autoridade Tributária e Aduaneira, ADSE, Direcção-Geral do Consumidor,Instituto da Segurança Social, “Linha de Atendimento Sexualidade em Linha”, “Linha da Juventude” e Lojas do Cidadão — que usavam linhas telefónicas com o prefixo 707, implicando custos elevados para os cidadãos que recorriam a contactos com a administração pública por essa via”.

  2. A Lei 7/2020, de 10 de Abril, no seu artigo 9.º, proíbe que os serviços públicos, em geral, usem quaisquer linhas de valor acrescentado:

As entidades públicas e empresas que prestam serviços públicos estão impossibilitadas de disponibilizar:

a) Números especiais de valor acrescentado com o prefixo «7», para contacto telefónico dos consumidores;

b) Apenas números especiais, números nómadas com o prefixo «30», ou números azuis com o prefixo «808», para contacto telefónico dos consumidores.”

 

  1. O que a lei – o DL 59/2021, de 14 de Julho - hoje estabelece, em geral, é um especial dever de informação segundo o qual “qualquer entidadeque torne disponíveis linhas telefónicas para contacto do consumidor deve divulgar, de forma clara e visível, nas suas comunicações comerciais, na página principal do seu sítio na Internet, nas facturas, nas comunicações escritas com o consumidor e nos contratos com este celebrados, quando os mesmos assumam a forma escrita, o número ou números telefónicos de contacto, aos quais deve ser associada, de forma igualmente clara e visível, informação actualizada relativa ao preço das chamadas”: “principiando pelas linhas gratuitas e pelas linhas geográficas ou móveis, apresentando de seguida, se for o caso, em ordem crescente de preço, o número e o preço das chamadas para as demais linhas.”

 

  1. O custo, para o consumidor, das chamadas, no âmbito de uma relação jurídica de consumo, não pode ser superior ao valor da sua tarifa de base.

 

  1. Por «tarifa de base» se entendeo custo de uma comunicação telefónica comum que o consumidor espera suportar de acordo com o respectivo tarifário de telecomunicações.

 

  1. O fornecedor, no entanto, está obrigado a facultar ao consumidor o acesso a uma linha telefónica gratuita ou, em alternativa, a uma linha telefónica a que corresponda uma gama de numeração geográfica ou móvel.

 

  1. Os fornecedores de serviços públicos essenciais são obrigados a facultar ao consumidor o acesso gratuito a uma linha para contacto telefónico no quadro das relações entre ambos estabelecidas.

 

  1. Constituem, entre outras,contra-ordenação económica

 

    1. Grave, a violação do dever especial de informação a que se refere o n.º 2.

    2. Muito grave, a violação da obrigação de disponibilizar linha telefónica gratuita a que se refere o n.º 6 no que tange aos serviços públicos essenciais, como é o caso da consulta.

EM CONCLUSÃO

  1. Está vedado aos serviços públicos em geral pôr à disposição do público quaisquer linhas de valor acrescentado [Lei 7/2020: art.º 9.º]

  2. Obrigam-se todas as entidades a informar os consumidores em qualquer suporte (facturas, comunicações escritas, etc.) dos números de telefone disponíveis para contactos [DL 59/2021: art.º 3.º]

  3. Os serviços públicos essenciais[entre os quais se inclui o das comunicações electrónicas] obrigam-se a facultar o acesso a números gratuitos, sob pena de contra-ordenação económica grave, cuja coima é variável em função da dimensão da empresa medida pelo número de trabalhadores ao seu serviço [DL 59/202021: art.º 5.º].

Tal é, salvo melhor juízo, o nosso parecer.

 

Mário Frota

presidente emérito da apDC – DIREITO DO CONSUMO -, Portugal