Mario Frota*

 

Os martírios a que se expõe uma diligente cidadã que acredita nos predicados de uma dada marca e nos códigos de conduta das empresas que a ostentam.

Tão logo pôs a máquina em funcionamento, a Whirpool fez das suas, comportou-se como se fora uma máquina “desfiadora”: rasgou umas calças de pijama fino de “meia estação”.

Não contente, logo a seguir, camisetas de desporto, um par de calções, e a safra continuou!

A reclamação não tardou.

A assistência técnica fez substituir o tambor da máquina, de posse dos termos da reclamação de imediato lavrada.

Meses mais tarde, nova avaria. Reclamação deduzida. Substituição de componentes eléctricos e electrónicos.

De novo, a rasgar,a rasgar sem dó nem piedade!

Nova reclamação formal: ou a substituição da máquina ou a sua devolução e consequente restituição do preço pago.

A marca entende proceder à substituição. Durante mais de um mês a dona de casa esteve privada da máquina, as reclamações sucederam-se. A Whirpool, sem justificação, promoveu, enfim, a contragosto, a substituição.Só em Março do ano em curso.

Como o outro, no dito popular, que “mudava de moleiro, mas não mudava de ladrão”, mudou-se a máquina de rasgar, mas não se mudou para uma de lavar.

A “substituta” não se fez rogada e para honrar decerto os pergaminhos da geração, em vez de lavar, rasga…

Máquina recolhida para testes. A consumidora, uma vez mais, privada do uso da coisa.

Resultado da perícia: anomalias não detectadas, máquina recolocada no domicílio da consumidora. “Sem mais nem aquelas”!

Nova reclamação formal: “põe-se termo ao contrato, recolham a máquina e restituam o dinheiro”.

A marca, intransigente: “nada mais se pode fazer”, “tem de ficar com a máquina”…

Cultura, cultura empresarial, eis o que elementarmente se exige e não abunda neste mercado às avessas!

As empresas são boas, péssimos são os consumidores… consumidores, já se vê, “rascas”, de “trazer por casa”!

Quando não há cultura empresarial, os desfavores aos consumidores avolumam-se!

O que se opina, na circunstância?

Porque em tempo, já que a nova máquina fora instalada em Março e, nos termos da Lei Antiga, beneficia de uma garantia de dois anos [sempre que se opere uma substituição, a garantia começa a contar da data de entrega do bem novo],

1.º: Declarar perante o vendedor, já que não poderá fazê-lo em relação ao fabricante [DL 67/2003: n.º 1 do artigo 6.º], a decisão de pôr termo ao contrato, com efeitos imediatos [DL 67/2003: n.ºs 4 e 5 do artigo 4.º], exigindo a pronta recolha da máquina e a restituição do preço pago.

Ao mesmo tempo, pedir uma indemnização

2.º pelos estragos que as máquinas causaram nas peças de roupa indicadas (e que são do conhecimento do vendedor e da marca): Lei das Garantias dos Bens de Consumo (DL 67/2003, de 8 de Abril e Lei de Defesa do Consumidor: n.º 1 do artigo 12);

3.º pelo tempo em que esteve privada do uso das máquinas, para cima de dois meses (Lei de Defesa do Consumidor – Lei 24/96, de 31 de Julho: n.º 1 do artigo 12, como se tem por elementar), pelos danos morais e materiais que suportou, como se tem por elementar, com o recurso a lavandarias, etc.

Se houver resistência do vendedor, há que recorrer ao Tribunal Arbitral de Conflitos de Consumo competente.

Que mercado, que mercadores estes!

 

*Presidente emérito da apDC – DIREITO DO CONSUMO - Portugal